Em um cenário de tapouilles (pequenos barcos à vela) bem coloridas, em frente ao Mahury, nós embarcamos pela manhã na vedette (tipo de lancha) da reserva natural da ilha do Grand Connétable. Hoje, a maior reserva natural marinha ultramarina nos aguarda.

Na época dos navios à vela, essa ilha era a sentinela que guardava a entrada do porto de Caiena. Ela permitia, após 3 ou 4 semanas de mar, o ajuste na rota dos navios para evitar o encalhe em terríveis recifes ou sobre os inúmeros bancos de areia que se espalham na chegada a terra. Foi nessa época que ela ganhou o apelido de “ilha dos pássaros”. Os capitães de navios, por diversão, davam tiros de canhão sobre a ilha para afugentar os milhares de pássaros que lá habitavam. Isso se tornou então uma tradição que marcava o fim da viagem.

Saindo do estuário margeado, de um lado pelas praias de areia de Montjoly e do outro lado pelos manguezais de polder Marianne, um grupo de sotálias (boto cinza) pode ser observado por alguns minutos. Esses pequenos golfinhos que povoam o litoral guianês são bastante ariscos e não se aproximam do barco.

À nossa esquerda nós deixamos as ilhas de Remire e ajustamos a proa para o sudeste. Ao longe, uma silhueta que poderia ser de um barco se desenha.  Na medida em que nos aproximamos podemos distingui-la cada vez mais. Essa forma tão particular já não nos deixa nenhuma dúvida. É a ilha do Grand Connétable. Um sol escaldante nos acompanha ao longo de todo o trajeto e nos oferece uma amostra do que será nosso dia na ilha. Na verdade, essa ilha, a única não reflorestada na Guiana Francesa, oferece poucas áreas de frescor. As rajadas e nuvens passam rapidamente para permanecerem mais tempo sobre a montanha de Kaw que podemos ver ao longe.

Após uma hora e meia de trajeto, nós entramos nas águas da reserva. À nossa frente se ergue essa rocha que abriga a única colônia de aves marinhas, entre os dois maiores grandes rios sul-americanos, o amazonas e o Orenoque. Depois dessa rocha, não há nada mais no horizonte, somente o oceano e alguns barcos camaroeiros, minúsculos ao longe.

Os pássaros nos cercam, vão e voltam, mergulham, pescam. Existem centenas a nossa volta, brancos, marrons, pretos, pequenos, grandes. A cada ano, de abril a setembro, a Ilha do Grand Connétable fica cheia de milhares de aves marinhas vindas do Caribe ou da costa brasileira para reproduzirem. Isso lhe rendeu a classificação como reserva natural em 1992.

Nós estamos sob o vento da ilha, um odor forte está no ar, onipresente, é o guano* que recobre a ilha quando os pássaros estão presentes. Esse cheiro pode ser sentido em todas as colônias de pássaros pelo mundo todo. Ele é sinônimo de paraíso de aves marinhas, de sítios virgens e livres de qualquer tipo de perturbação. Para completar a paisagem, temos que citar o barulho ensurdecedor produzido pelos 3.000 casais de Gaivotas-Alegres que chegam à ilha para se aninharem.

As atividades humanas são uma das causas mais importantes de limitação das populações de aves marinhas. Se no passado, as capturas humanas de ovos, filhotes ou adultos para o consumo, tiveram um importante impacto local, hoje essas práticas são abolidas na ilha do Grand Connétable.

Uma pequena baía, bem protegida do marulho oceânico de dos alísios, permite o desembarque que pode parecer no mínimo imprudente. Na verdade, é preciso pular do barco sobre a única pequena rocha saliente que me garantiram que não escorrega. O último terá que juntar-se a nós a nado, após ter amarrado o navio a uns cinquenta metros da ilha. Esse desembarque, pouco prático, é uma das garantias mais seguras de tranquilidade para o sítio e não há nada previsto para facilitá-lo.

Enfim nós colocamos os pés sobre a ilha. Agora só falta chegar ao platô situado a 25m de altura por uma trilha estreita na encosta da colina que não permite nenhum passo em falso, literalmente. Uma vez a rampa escalada, nós descobrimos um fascinante espetáculo. Lá estão elas espalhadas, às dúzias, majestosas Fragatas-Comuns. Elas são entre 3.000 e 4.000 na ilha, o que representam aproximadamente 5 % da população do Caribe. Com seus 2,5 m de envergadura, elas impõem respeito e se aproveitam disso para se alimentar: roubam a comida das outras espécies em pleno voo.

Elas nos observam tomar a trilha, nem se mexem confiantes de estarem no melhor lugar, essas são as donas do lugar, elas guardam a ilha o ano todo. Essas grandes aves calmas não parecem incomodadas pela agitação sazonal de seus vizinhos barulhentos.

Nós descansamos um pouco à sombra de uma pequena cabana antes de continuar a visita.

Como a ilha cai diretamente no mar, olhando por sobre a borda da falésia, nós podemos observar as tartarugas verdes que se aproximam para pastar algumas algas presas nos arredores da base rochosa. Nós estamos no limite entre as águas oceânicas e as águas costeiras carregadas de limo. Alguns dias por ano, a água pode ser bastante clara para que nós possamos perceber a sombra de uma Garoupa gigante que vive nos rochedos em volta da ilha. A garoupa gigante foi uma das primeiras espécies de peixes inscritas na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza e mesmo que a espécie seja classificada como estando em risco crítico de extinção em nível mundial, a pesca à Garoupa é autorizada nas águas francesas enquanto é proibida em qualquer outro lugar e nas águas de nossos vizinhos (Brasil, Caribe, Flórida…). É por essa razão que um estudo está em andamento na Guiana Francesa, com o apoio da reserva, para melhor conhecer a situação local dessa população.

Nós deixamos a beira da falésia, atraídos por um barulho de fundo atrás de uma fileira de cacto prateado que bloqueia nossa visão. Piados incessantes escondem uma intensa atividade. Em um esconderijo, nós descobrimos uma plataforma coberta por milhares de casais de garajaus. Coabitam nessa colônia, Trinta-réis-de-bando e Garajaus-reais.

Na verdade, nesse lugar de meio hectare, mais de 8.000 casais de garajaus se encontram todos os anos para a postura. Isso representa um terço da população mundial. O fato de a ilha se transformar em uma reserva teve um efeito espetacular sobre essa espécie das quais os efetivos passaram de 300 casais no momento da criação da reserva em 1992, para mais de 8.000 casais desde 2005. Enquanto a distância entre os indivíduos é superior ao comprimento de bico, a coabitação é boa, mas coitado do pássaro que errar sua aterrisagem, ele será expulso na base das bicadas do ninho do vizinho.

Um garajau maior com um grande bico laranja atrai minha atenção. É um Garajau-real (ou trinta-réis-real) do qual, 1.500 casais também desembarcam no período de reprodução para criar seus filhotes. Essa espécie bota seu único ovo sobre a mesma plataforma que suas primas menores e criam seus filhotes ao mesmo tempo. Nós temos a sorte de ver a metade da população caribenha desse garajau agrupada no mesmo lugar e no mesmo momento.

Nosso passeio pela ilha, nós nos aproximamos dos ninhos de trinta-réis-escuros. Eles estão pousados na mesma rocha, sobre uma pequena Saliência na encosta de falésia, os dois adultos estão lá e protegem ferozmente seu filhote. Um dos dois adultos voa grasnando sobre nós para nós com a intenção de nos bicar e para não perturbá-los por mais tempo, decidimos sair dali.

É hora de descermos desse observatório no meio do oceano, voltar para o barco e ir para Dégrad-des-Cannes. Conforme avançamos, vemos menos pássaros e o último garajaú nos sobrevoa como se nos cumprimentasse. O porto está logo à frente, a noite chega e a tranquilidade reina.